O diretor Jorge Furtado
usou seu blog pessoal para rebater as manifestações de artistas brasileiros que
criticaram a atual situação social, política e econômica do Brasil. O texto foi
publicado um dia após as declarações de Wagner Moura para jornal O Estado de S. Paulo, em que o ator se diz
satisfeito em deixar o país por dois anos.
Leia abaixo a íntegra do
texto de Furtado:
Fico
triste ao ver artistas brasileiros, meus colegas, tão mal informados. Imagino
que, com suas agendas cheias, não tenham muito tempo para procurar diferentes
fontes para a mesma informação, tempo para ouvir e ler outras versões dos
acontecimentos, isso antes de falar sobre eles em entrevistas, amplificando
equívocos com leituras rasas e impressionistas das manchetes de telejornais e
revistas ou, pior, reproduzindo comentários de colunistas que escrevem suas
manchetes em caixa alta, seguidas de ponto de exclamação.
Fico
triste ao ler artistas dizendo que não dá mais para viver no Brasil, como se as
coisas estivessem piorando, e muito, para a maioria. Dizer que não dá mais para
viver no Brasil logo agora, agora que milhões de pessoas conquistaram alguns
direitos mínimos, emprego, casa própria, luz elétrica, acesso às universidades
e até, muitas vezes, a um prato de comida, não fica bem na boca de um artista,
menos ainda de um artista popular, artista que este mesmo povo ama e admira.
Em
que as coisas estão piorando? E piorando para quem? Quem disse? Qual a fonte da
sua informação?
Fico
triste ao ouvir artistas que parecem sentir orgulho em dizer que odeiam
política, que julgam as mudanças que aconteceram no Brasil nos últimos 12 anos
insignificantes, ou ainda, ruins, acham que o país mudou sim, mas foi para
pior.
Artistas
dizendo que pioramos tanto que não há mais jeito da coisa “voltar ao ‘normal
‘”, como se normal talvez fosse ter os pobres desempregados ou abrindo portas
pelo salário mínimo de 60 dólares, pobres longe dos aeroportos, das lojas de
automóvel e das universidades, se “normal” fosse a casa grande e a senzala, ou
a ditadura militar. Quando o Brasil foi normal? Quando o Brasil foi melhor? E
melhor para quem?
A
mim, não enrolam. Desde que eu nasci (1959) o Brasil não foi melhor do que é
que hoje. Há quem fale muito bem dos anos 50, antes da inflação explodir com a
construção de Brasília, antes que o golpe civil-militar, adiado em 1954 pelo
revólver de Getúlio, se desse em 1964 e nos mergulhasse na mais longa ditadura
militar das américas. Pode ser, mas nos anos 50 a população era muito menor,
muito mais rural e a pobreza era extrema em muitos lugares. Vivia-se bem na
zona sul carioca e nos jardins paulistas, gaúchos e mineiros. No sertão, nas
favelas, nos cortiços, vivia-se muito mal.
A
desigualdade social brasileira continua um escândalo, a violência é um terror
diário, 50 mil mortos a tiros por ano, somos campeões mundiais de assassinatos,
sendo a maioria de meninos negros das periferias, nossos hospitais e escolas
públicos são para lá de carentes, o Brasil nos dá motivos diários de vergonha e
tristeza, quem não sabe? Mas, estamos piorando? Tem certeza? Quem lhe disse?
Qual sua fonte? E piorando para quem?”
Jorge Furtado
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