A ministra ressaltou que a ilegalidade do procedimento amplia a discriminação contra as mulheres
A Corte julga a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) impetrada pelo PSOL e o Instituto de Bioética Direitos Humanos e Gênero (Anis), que argumenta que proibir a interrupção da gravidez viola a dignidade humana das mulheres.
Em seu voto, Weber dá exemplos de estudos que mostram que a criminalização do aborto não é a política pública adequada sobre o tema. "A justiça social reprodutiva, fundada nos pilares de políticas públicas de saúde preventivas na gravidez indesejada, revela-se como desenho institucional mais eficaz na proteção do feto e da vida da mulher, comparativamente à criminalização."
A ministra ressaltou que a ilegalidade do procedimento amplia a discriminação contra as mulheres. "A criminalização perpetua o quadro de discriminação com base no gênero, porque ninguém supõe, ainda que em última lente, que o homem de alguma forma seja reprovado pela sua conduta de liberdade sexual, afinal a questão reprodutiva não lhe pertence de forma direta", diz a magistrada.
Atualmente, o aborto é legal no Brasil em apenas três casos: quando a gravidez é decorrente de estupro, a vida da gestante corre risco ou o feto tem diagnóstico de anencefalia. O fato de o aborto ser ilegal na maioria das situações, no entanto, não impede a sua prática. De acordo com o Instituto Anis, a cada ano cerca de um milhão de gestações são descontinuadas no país.
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Weber assinalou que abortos inseguros e o risco aumentado da taxa de mortalidade revelam o impacto desproporcional da regra da criminalização da interrupção voluntária da gravidez. "Não apenas em razão do sexo, do gênero, mas igualmente, e com mais densidade, nas razões de raça e condições socioeconômicas", argumentou.
A ministra também sustentou que a visão sobre aborto que vigora hoje no Brasil não considera "a igual proteção dos direitos fundamentais das mulheres, dando prevalência absoluta à tutela da vida em potencial (feto)". Conforme a ministra, "a depender do estágio de desenvolvimento biológico do feto, diminui-se o interesse em sua proteção face à precedência da tutela dos direitos da mulher".
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Portanto, diz Rosa, "a maternidade não há de derivar da coerção social fruto de falsa preferência da mulher, mas sim do exercício livre da sua autodeterminação na elaboração do projeto de vida".
Regra de 1940
No final de seu voto, a ministra destacou ainda que as mulheres eram excluídas da condição de "sujeito de direito" na década de 1940, data do Código Penal que criminalizou o aborto "de forma absoluta". "Não tivemos como participar ativamente da deliberação sobre questão que nos é particular, que diz respeito ao fato comum da vida reprodutiva da mulher", declara.
"A dignidade da pessoa humana, a autodeterminação pessoal, a liberdade, a intimidade, os direitos reprodutivos e a igualdade como reconhecimento, transcorridas as sete décadas, impõem-se como parâmetros normativos de controle da validade constitucional da resposta estatal penal", disse.
Weber também defendeu que o STF não pode "furtar-se ao dever de fazer valer a Constituição" diante de "ato do Poder Legislativo materializador de escolha política". Ela diz que o Legislativo, "ao sacrificar os direitos fundamentais das mulheres" que estão protegidos pela Constituição, "ingressa em terreno que lhe fora interditado".
Brasil de Fato
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